FHC é citado por três jornalistas quanto ao seu envolvimento com a
espionagem dos EUA. - Quem pagou a conta? está esgotado nas livrarias do Rio
Está esgotado nas duas maiores livrarias do Rio o livro da escritora
Frances Stonor Saunders Quem
pagou a conta? A CIA na Guerra Fria da cultura, no qual o ex-presidente
Fernando Henrique Cardoso é acusado, frontalmente, de receber dinheiro da
agência norte-americana de espionagem, para ajudar os EUA a “venderem melhor
sua cultura aos povos nativos da América do Sul”. O exemplar, cujo preço varia
de R$ 72 a R$ 75,00, leva entre 35 e 60 dias para chegar ao leitor, mesmo
assim, de acordo com a disponibilidade no estoque. O interesse sobre a obra da
escritora e ex-editora de Artes da revista britânica The New Statesman, no Brasil,
pode ser avaliado ao longo dos cinco anos de seu lançamento.
Quem pagou a conta?, segundo os editores, recebeu “uma ampla cobertura pela mídia quando
foi lançado no exterior”, em 1999. Na obra, Frances Stonor Saunders narra em
detalhes como e por que a CIA, durante a Guerra Fria, financiou artistas, publicações
e intelectuais de centro e centro-esquerda, num esforço para mantê-los
distantes da ideologia comunista. Cheia de personagens instigantes e
memoráveis, entre eles o ex-presidente brasileiro, “esta é uma das maiores
histórias de corrupção intelectual e artística pelo poder”.
“Não é segredo para ninguém que, com o término da Segunda Guerra
Mundial, a CIA passou a financiar artistas e intelectuais de direita; o que
poucos sabem é que ela também cortejou personalidades de centro e de esquerda,
num esforço para afastar a intelligentsia do comunismo e aproximá-la do American way of life. No livro,
Saunders detalha como e por que a CIA promoveu congressos culturais, exposições
e concertos, bem como as razões que a levaram a publicar e traduzir nos Estados
Unidos autores alinhados com o governo norte-americano e a patrocinar a arte
abstrata, como tentativa de reduzir o espaço para qualquer arte com conteúdo
social. Além disso, por todo o mundo, subsidiou jornais críticos do marxismo,
do comunismo e de políticas revolucionárias. Com esta política, foi capaz de
angariar o apoio de alguns dos maiores expoentes do mundo ocidental, a ponto de
muitos passarem a fazer parte de sua folha de pagamentos”.
As publicações Partisan Review, Kenyon Review, New Leader e Encounter foram algumas das publicações que receberam apoio direto ou indireto dos cofres da CIA. Entre os intelectuais patrocinados ou promovidos pela CIA, além de FHC, estavam Irving Kristol, Melvin Lasky, Isaiah Berlin, Stephen Spender, Sidney Hook, Daniel Bell, Dwight MacDonald, Robert Lowell e Mary McCarthy, entre outros. Na Europa, havia um interesse especial na Esquerda Democrática e em ex-esquerdistas, como Ignacio Silone, Arthur Koestler, Raymond Aron, Michael Josselson e George Orwell.
O jornalista Sebastião Nery,
em 1999, quando o diário conservador carioca Tribuna
da Imprensa ainda circulava em sua versão impressa, comentou em sua
coluna que não seria possível resumir a obra em tão pouco espaço: “São 550
páginas documentadas, minuciosa e magistralmente escritas”, afirmou.
Dinheiro
para FHC
“Numa noite de inverno do ano de 1969, nos escritórios da Fundação Ford,
no Rio, Fernando Henrique teve uma conversa com Peter Bell, o representante da
Fundação Ford no Brasil. Peter Bell se entusiasma e lhe oferece uma ajuda
financeira de US$ 145 mil. Nasce o Cebrap (Centro Brasileiro de Análise e
Planejamento)”. Esta história, que reforça as afirmações de Saunders, está
contada na página 154 do livro Fernando
Henrique Cardoso, o Brasil do possível, da jornalista francesa Brigitte
Hersant Leoni (Editora Nova Fronteira, Rio, 1997, tradução de Dora Rocha). O
“inverno do ano de 1969″ era fevereiro daquele ano.
Há menos de 60 dias, em 13 de dezembro, a ditadura militar havia lançado
o AI-5 e elevado ao máximo o estado de terror após o golpe de 64, “desde o início
financiado, comandado e sustentado pelos Estados Unidos”, como afirma a autora.
Centenas de novas cassações e suspensões de direitos políticos estavam sendo
assinadas. As prisões, lotadas. O ex-presidente Juscelino Kubitcheck e o
ex-governador Carlos Lacerda tinham sido presos. Enquanto isso, Fernando
Henrique recebia da poderosa e notória Fundação Ford uma primeira parcela para
fundar o Cebrap. O total do financiamento nunca foi revelado. Na Universidade
de São Paulo, por onde passou FHC, era voz corrente que o compromisso final dos
norte-americanos girava em torno de US$ 800 mil a US$ 1 milhão.
Segundo reportagem publicada no diário russo Pravda, um ano após o lançamento
do livro no Brasil, os norte-americanos “não estavam jogando dinheiro pela
janela”.
“Fernando Henrique já tinha serviços prestados. Eles sabiam em quem
estavam aplicando (os dólares)”. Na época, FHC lançara com o economista chileno
Faletto o livro Dependência e
desenvolvimento na América Latina, em que ambos defendiam a tese de que
países em desenvolvimento ou mais atrasados poderiam desenvolver-se mantendo-se
dependentes de outros países mais ricos. Como os Estados Unidos”. A cantilena
foi repetida por FHC, em entrevista concedida ao diário conservador paulistano Folha de S. Paulo, na edição da
última terça-feira, a última de 2013.
Com a cobertura e o dinheiro dos norte-americanos, FHC tornou-se,
segundo o Pravda, “uma ‘personalidade
internacional’ e passou a dar ‘aulas’ e fazer ‘conferências’ em universidades
norte-americanas e europeias. Era ‘um homem da Fundação Ford’. E o que era a
Fundação Ford? Uma agente da CIA, um dos braços da CIA, o serviço secreto dos
EUA”.
Principais
trechos da pesquisa de Saunders:
1 – “A Fundação Farfield era uma fundação da CIA… As fundações
autênticas, como a Ford, a Rockfeller, a Carnegie, eram consideradas o tipo
melhor e mais plausível de disfarce para os financiamentos… permitiu que a CIA
financiasse um leque aparentemente ilimitado de programas secretos de ação que
afetavam grupos de jovens, sindicatos de trabalhadores, universidades, editoras
e outras instituições privadas” (pág. 153).
2 – “O uso de fundações filantrópicas era a maneira mais conveniente de
transferir grandes somas para projetos da CIA, sem alertar para sua origem. Em
meados da década de 50, a intromissão no campo das fundações foi maciça…” (pág.
152). “A CIA e a Fundação Ford, entre outras agências, haviam montado e
financiado um aparelho de intelectuais escolhidos por sua postura correta na
guerra fria” (pág. 443).
3 – “A liberdade cultural não foi barata. A CIA bombeou dezenas de
milhões de dólares… Ela funcionava, na verdade, como o ministério da Cultura
dos Estados Unidos… com a organização sistemática de uma rede de grupos ou
amigos, que trabalhavam de mãos dadas com a CIA, para proporcionar o
financiamento de seus programas secretos” (pág. 147).
4 – “Não conseguíamos gastar tudo. Lembro-me de ter encontrado o
tesoureiro. Santo Deus, disse eu, como podemos gastar isso? Não havia limites,
ninguém tinha que prestar contas. Era impressionante” (pág. 123).
5 – “Surgiu uma profusão de sucursais, não apenas na Europa (havia escritorios
na Alemanha Ocidental, na Grã-Bretanha, na Suécia, na Dinamarca e na Islândia),
mas também noutras regiões: no Japão, na Índia, na Argentina, no Chile, na
Austrália, no Líbano, no México, no Peru, no Uruguai, na Colômbia, no Paquistão
e no Brasil” (pág. 119).
6 – “A ajuda financeira teria de ser complementada por um programa
concentrado de guerra cultural, numa das mais ambiciosas operações secretas da
guerra fria: conquistar a intelectualidade ocidental para a proposta
norte-americana” (pág. 45).
Espionagem
e dólares
Não há registros imediatos de que o ex-presidente tenha negado ou
admitido as denúncias constantes nos livros de Sauders e Leoni. Em julho do ano
passado, no entanto, o jornalista Bob Fernandes, apresentador da TV Gazeta, de São Paulo, publicou
artigo no qual repassa o envolvimento do ex-presidente com os serviços de
espionagem dos EUA, sem que tivesse precisado, posteriormente, negar uma só
palavra do que disse. Segundo Fernandes, “o ex-presidente Fernando Henrique
Cardoso diz que ‘nunca soube de espionagem da CIA’ no Brasil. O governo atual
cobra explicações dos Estados Unidos”.
“Vamos aos fatos. Entre março de 1999 e abril de 2004, publiquei 15
longas e detalhadas reportagens na revista CartaCapital. Documentos, nomes,
endereços, histórias provavam como os Estados Unidos espionavam o
Brasil.Documentos bancários mostravam como, no governo FHC, a DEA, agência
norte-americana de combate ao tráfico de drogas, pagava operações da Polícia
Federal. Chegava inclusive a depositar na conta de delegados. Porque aquele era
um tempo em que a PF não tinha orçamento para bancar todas operações e a DEA
bancava as de maiores dimensão e urgência”, garante Fernandes.
Ainda segundo o jornalista, o mínimo de “16 serviços secretos dos EUA
operavam no Brasil. Às segundas-feiras, essas agências realizavam a ‘Reunião da
Nação’, na embaixada, em Brasília”.
Bob Fernandes, que foi redator-chefe de CartaCapital,
trabalhou nas revistas IstoÉ (BSB
e EUA) eVeja, foi repórter da Folha de S.Paulo e do Jornal do Brasil, afirma ainda
que “tudo isso foi revelado com riqueza de detalhes: datas, nomes, endereços,
documentos, fatos. Em abril de 2004, com a reportagem de capa, publicamos os
nomes daqueles que, disfarçados de diplomatas, como é habitual, chefiavam CIA,
DEA, NSA e demais agências no Brasil. Vicente Chellotti, diretor da PF, caiu
depois da reportagem de capa Os
Porões do Brasil, de 3 de março de 1999. Isso no governo de FHC, que
agora, na sua página no Facerbook,
disse desconhecer ações da CIA no país”.
Fonte Correio do Brasil